Foi amor à primeira vista. No momento em que ela o viu, tudo à sua volta parou: nada existia nem respirava.Parecia cena de filme, só que congelada, como quando se para a cena no DVD. Ela poderia dizer o que ele vestia naquele momento, o tom exato de sua voz, a cor de seus cabelos e olhos. Era um momento cristalizado na eternidade. No entanto, durara apenas alguns segundos: o tempo exato de um amigo comum apresentá-los. O amor chegou para ela com a força e a rapidez de um raio.
Desde então, sua vida passou a ter um novo colorido. Seu coração se acelerava quando o via, ficava vermelha se ele lhe dirigia a palavra e tudo caía de suas mãos. Um dia, ele lhe pediu seu telefone. Disse que queria “manter contato” e que lhe telefonaria.
Os dias se passaram e ela sempre esperava o telefonema. Cada vez que o telefone tocava, seu coração acelerava, o ar lhe faltava e ela corria para o aparelho. Era a amiga com problemas, o aluno pedindo um auxílio ou a tia querendo tirar dúvidas a respeito de uma receita culinária.
E o telefone estava sempre ali... e em sua mente. Crescera de tamanho, ficara imenso... do tamanho de sua ansiedade. E o pior, é que ela não queria ficar presa ao aparelho, mas este parecia ser mais forte do que ela – tinha uma atração irresistível: dominava sua mente e seus pensamentos!
Por mais que ela não quisesse, era dominada por ele! E no entanto, ela tinha uma péssima relação com telefones: ela os odiava. Sua primeira decepção acontecera através do telefone. Ela tinha cinco anos. Seus pais haviam se separado. Seu pai saíra de casa e morava num hotel. Prometera jantar sempre com ela às sextas feiras. Logo na primeira semana em que ele jantaria com ela, a comida já estava sobre a mesa e ela esperava que o pai batesse à porta a qualquer instante. O telefone tocou (sempre o maldito telefone!). Era o pai, para dizer que não poderia ir jantar com ela, pois ia jogar futebol com os amigos. Ela ficara parada ali, com o telefone na mão, sentindo uma imensa sensação de vazio...
Agora, ela estava se tornando dependente de um telefone. E se ele ligasse na hora em que ela não estivesse em casa? Como ela saberia se ele havia ligado ou não? Resolveu então instalar um identificador de chamadas.
Começaram a aparecer em seguida, números de telefones desconhecidos e variados. E se ele tivesse ligado de um deles? Poderia estar no trabalho ou na faculdade, quem sabe mesmo na rua e resolvera ligar para ela, fazer um convite...
Ela não tinha coragem de ligar para estes números. Tinha medo de que fosse realmente ele ou, pior, que não fosse ele (e o trauma da decepção por telefone?).
Um dia, o aparelho de identificação de chamadas queimou. Estava aceso, funcionando, e no instante seguinte, não estava mais. A ansiedade dela aumentou. E agora? Como iria saber quem ligara?
O telefone tocava e ela tinha medo de enfrentar a realidade que estava do outro lado da linha. Então, começou a receber muitas chamadas, durante todo o dia. O telefone dava apenas quatro toques. Ela sabia que isto indicava, normalmente, que era uma ligação feita por um homem, pois as mulheres nunca se contentavam com quatro toques. As mulheres, via de regra, têm uma esperança insistente de que alguém vai atender o telefone do outro lado da linha. E agora? O que ela fazia? Atendia ou não o telefone?
Ela começou a criar coragem: atendia, mas não dizia absolutamente nada. Do outro lado da linha acontecia a mesma coisa... e desligavam.
A mente dela começou a dar voltas e mais voltas: ele estava criando coragem para falar com ela, ou talvez estivesse apenas querendo ouvir sua voz; quem sabe não estivesse apenas querendo confirmar se ela estava em casa – poderia ser ciumento!
Em meio a estes pensamentos, um dia ela criou coragem e falou ao telefone:
- Alô!
- É da oficina Santo Antônio? Estou há dias tentando falar com alguém daí.
Teresinha, como todos os meus comentários, faço-os na mesma hora em que leio e vou expressando minha opinião sobre o que estou lendo. Portanto, desculpe os erros gramaticais. Mas se for pensar no que vou escrever, acabo não escrevendo. Tem que ser algo no calor da hora.
ResponderExcluirEis a minha impressão do seu conto.
O início é ingenuo, bem ao estilo adolescente. Que tem suas emoções a flor da pele e com proporções desmesuradas.Depois a narrativa revela uma espera tresloucada e “ansiolítica”. O quarto parágrafo é show de bola. Tem um cunho psicologizante e obssessivo e de pura subjugação do sujeito pelo objeto. A demora do contato que inevitavelmente já prenuncia apenas uma mera formalidade de pegar o telefone e nada mais. Com a insatisfação do desejo mais do que frustrada, surge um elemento pessoal que parece fazer a persongem (sem nome, pois pode ser qualquer um que tenha passado, e quase todos já passamos por isso) se esconder atrás de uma recordação malfadada da infância o que diminui a sua autoestima a ponto de lhe impingir um acovardamento momentâneo, até que ela decida enfrentar e perceber que tudo o que imaginara a respeito das ligações era algo puramente fantasioso. Isso é pior, mas faz com que o final do conto ganhe uma suspensão do juizo e não termina terminado. Algumas pessoas criam coisas que só estão em suas mentes, mas que de fato é outra coisa completamente distinta e quase sempre distanciada do que imaginamos e criamos monstros e heróis.
Neide, amei sua análise. É muito interessante como quem lê, observa e enxerga coisas, que quando a gente está escrevendo nem passa pela nossa cabeça! Descobri coisas em seu comentário que não tinha percebido. Mas fiquei feliz com as últimas linhas de seu comentário, pois parece que consegui passar no conto o essencial da idéia que tinha ao escrevê-lo, que é exatamente o que você fala: como nossa mente pode criar coisas (medos, monstros, heróis, fantasmas), que só estão nela e que um "choque de realidade" sempre faz bem!
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